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Gosto se discute? A Crítica da faculdade do Juízo, de Immanuel Kant





Na Crítica da faculdade do Juízo, de Immanuel Kant há duas afirmações , a princípio contraditórias, que assumem a forma de teses que se opõem: uma tese e uma antítese. É o que Kant denomina "antinomia do gosto".

A tese: "O juízo de gosto não se funda em conceitos, caso contrário, poderíamos disputar acerca da beleza". ( decidir por meio de demonstrações lógicas).

A antítese: " O juízo de gosto se funda em conceitos, caso contrário, não poderíamos sequer discutir a beleza."

Qual então o lugar da beleza?

É um conceito objetivo universalmente válido e necessário, ou, ao contrário, é algo subjetivo e que se funda apenas em inclinações pessoais, uma questão de âmbito privado e incomunicável?

Crítica para Kant, significa um exame do alcance e dos limites de nossos poderes cognitivos.

A "Crítica da razão Pura" fala sobre o conhecimento científico, necessário e Universal. Foi a primeira etapa do projeto sistemático de Kant visando a estabelecer a abrangência e os limites de nosso conhecimento, daquilo que podemos ou não conhecer; ou seja, trata-se de filosofia teórica voltada à teoria do conhecimento.

Em a "Crítica da razão prática", Kant analisa as condições de possibilidade para uma moral com pretensão universalista dos atos. Ele voltou-se imediatamente para moral, ou o conhecimento prático das leis que comandam as ações humanas e na capacidade que a razão tem de criar uma causa que, diferente do mundo mecânico natural, não depende de nenhuma causa anterior a ela. O ato livre não teria nenhum fator externo que o determinasse, É o fazer, pelo sentimento de dever que sou capaz de perceber e a necessidade de determinadas ações.

Em sua 3ª crítica, a "Crítica da faculdade do juízo",Kant fala sobre a possibilidade dos juízos estéticos, universais e necessários. Investiga os limites daquilo que podemos conhecer pela faculdade de julgar, que leva em consideração não apenas a razão, mas também a memória e os sentimentos.

Os enunciados de um juízo é o que é denominado, proposição ou premissa.

O juízo "a priori", é o conhecimento puro, que independe da experiência. Ele é essencial e se aplica a qualquer situação; já, o juízo "a posteriori" é dependente de uma experiência ou evidência empírica. Esses conhecimentos experimentais são os que nos fornecem sensações, conhecimentos que não podem ser separados de nossas impressões sensoriais. Mas eles não produzem juízos essenciais, que possam ser aplicados a qualquer situação.

Os juízos analíticos são aqueles em que os atributos fazem parte do próprio conceito. Por exemplo, na afirmação de que todos os corpos são extensos, a qualidade "extenso" já está contida no termo "corpo". Os juízos analíticos são típicos da tradição racionalista cartesiana, que construía a ciência com explicação dedutiva a partir de algumas verdades evidentes. Embora sejam "a priori" e possuam o mérito da indiscutibilidade, eles limitam-se à afirmações óbvias, não podendo construir a base de um conhecimento cognitivo.

Já os juízos sintéticos, mesmo que sejam fecundos em produzir novos conhecimentos, encontram em contrapartida a limitação e dependência de uma experiência concreta. Eles acrescentam predicados novos ao conceito. Mas a afirmação da existência de alguma coisa só é possível "a posteriori", ou seja, somente depois de ter passado pela experiência concreta. O predicado não é extraído do sujeito, mas pela experiência. Exemplo da afirmação de que "o corpo é pesado". Diferentemente da afirmação de que o corpo é extenso, onde o predicado está implícito no conceito "corpo", o fato de ser "pesado" não é um conhecimento subentendido no conceito, mas adquirido "a posteriori" , através da experiência. Essa afirmação "a posteriori" de que o corpo é pesado, agrega um conhecimento empírico, qual seja, o peso.Mas, a experiência é o único meio pelo qual esse conhecimento, esse predicado, pode ser obtido. Mas, para Kant, se podemos afirmar a existência de alguma coisa somente depois de ter passado pela experiência concreta, essa ciência não pode ser preditiva.

Para o filósofo, o racionalismo e o dogmatismo deram muita ênfase aos elementos apriorísticos, enquanto o empirismo , havia reduzido o conhecimento aos elementos experimentais "a posteriori".

Seria, pois necessário a formulação de uma abordagem do conhecimento, que ao mesmo tempo que tivesse certeza e universalidade dos juízos analíticos "a priori", não nos lançasse no terreno do dogmatismo. Uma abordagem híbrida, onde a sensibilidade e a fecundidade dos juízos sintéticos se somasse ao Entendimento .

Portanto, tais juízos teriam que ser conhecimento" sintético a priori", porque, uma vez suas leis estabelecidas pela observação, passam a ser universais e independentes da experiência.

A Crítica do Juízo, a terceira e última crítica de Kant, descreve dois tipos de juízos que constituem a faculdade de julgar: o determinante e o reflexionante. Os juízos reflexionantes são de dois tipos: os estéticos e os teleológicos.

Se de um lado temos um pensamento fundado em leis da razão e do entendimento, em regras que não variam de uma pessoa a outra, de uma cultura a outra, ou mesmo de uma época a outra, ou seja, um conhecimento fundado em princípios universalmente válidos e necessários, por outro lado, temos um empirismo estético não racionalista, onde ao dizer "esta rosa é bela" , traduzo apenas num juízo um senti­mento de prazer que acompanha essa contemplação.

Assim, o juízo estético é reflexionante, porque descreve aquilo que o sujeito sente. A beleza não é uma coisa nem uma propriedade das coisas. É um sentimento que é vivido no interior do sujeito e do qual este tem consciência.

O juízo estético é igualmente a expressão de um sentimento de prazer puro e desinteressado; o sentimento do belo nada tem a ver com a fa­culdade de desejar, ou com a vontade. Dizer que algo é belo é diferente de dizer que é agra­dável. Não julgo algo belo por necessidade, por um desejo de posse.
O agradável, sempre possui  alguma relação de desejo com o objeto qualificado de belo.

O prazer desinteressado significa que o sujeito que faz um julgamento estético sobre um objeto não tem nenhuma necessidade de possuir ou consumir esse objeto, ou seja, o objeto não desperta qualquer desejo no sujeito que o contempla.

Segundo Kant, para nos pronunciarmos sobre a qualidade estética de alguma coisa, para julgarmos se algo é belo ou não, devemos contemplá-lo abstraindo de nossa consideração, qualquer possí­vel utilidade, inutilidade e também , qualquer noção de moralidade. O juízo estético é radicalmente di­ferente de qualquer juízo ligado a um interesse.

Enquanto su­jeito estético acolho a livre manifestação do objeto e digo simplesmente o que sinto, o que se passa em mim. Assim, juízo de gosto é subjetivo. Contudo, este juízo pretende ser universalmente comunicável. O juízo esté­tico é subjetivamente universal, pois quando eu digo que algo é belo eu pretendo traduzir um sentimento que se verifica em mim, mas que também deve ocorrer nos outros sujeitos, pois meu juízo não se baseia em inclinações ou interesses particulares e pessoais. Assim, acredito que posso julgar-me no di­reito de que os outros reconheçam também a beleza do objeto e experimentem o tipo de satisfação que eu sinto.

Quando contemplo uma paisagem e sinto um prazer puro e desinteressado nessa con­templação, meu entendimento traduz essa experiência formulando um juízo: "Esta paisagem é bela."O conceito de beleza unicamente exprime um sentimento, mas não o explica, porque se isso acontecesse a experiência já não seria estética mas de conhecimento.  A universalidade do juízo acerca da beleza não é baseado em conceitos. Ou seja, quando alguém propõe compartilhar o sentimento de beleza, não pretende convencer os outros por meio da subsunção desse objeto (singular) em um conceito (universal.)

 Nas palavras de Pedro Costa Rego,temos o direito de candidatar nossa avaliação estética a um estatuto de juízo universalmente válido. Há um fundamento no sujeito para isso. Mas, jamais deixará o belo de ser uma universalidade subjetiva, uma universalidade meramente reivindicada.

Como o juízo estético tem de ser ex­pressão de um prazer puro ou desinteressado, que não submete o objeto a nenhum desejo, interesse ou fim, também a sua finalidade só pode ser uma "finalidade sem fim". O valor-em-si do juízo estético pressupõe um prazer desinteressado, portanto não finalista.

 E finalizando com as palavras de Luc Ferry: Homo aestheticus: a invenção do gosto na era democrática, “A solução da antinomia do gosto encontra aqui sua explicação e seu significado. Contrariamente ao que afirma o racionalismo clássico, o juízo de gosto não se fundamenta em conceitos (regras) determinados: portanto, torna-se impossível ‘disputar’ acerca dele como se tratasse de um juízo de conhecimento científico. No entanto, ele não se limita a remeter à pura subjetividade empírica do sentimento, porque se baseia na presença de um objeto, que se é belo (...), desperta uma ideia necessária da razão que é, enquanto tal, comum à humanidade. Portanto, é em referência a essa ideia determinada (..) que é possível ‘discutir’ o gosto e ampliar a esfera da subjetividade pura para visar uma partilha não dogmática da experiência estética com outrem enquanto outro homem”



Fontes:

Kant- Crítica da Faculdade do Juízo 
Kant - Crítica da Razão Pura

Georges Pascal - Compreender Kant

Pedro Costa Rego - Palestra proferida no Seminário Internacional do Vale do Rio Doce

Textos diversos ( Internet), anotações de aulas e resumos.

O Belo - Sócrates, Platão e Aristóteles


Entre os gregos existiam três acepções fundamentais  acerca do Belo:

 O Belo em termos estéticos - Inseparável da medida e contenção, onde a qualidade dos elementos, como os sons e as cores agradáveis, a regularidade das figuras geométricas e das formas abstratas, como simetria e proporções definidas, de maneira harmoniosa e adequada aos sentidos, é tudo aquilo que é agradável à vista e aos ouvidos;   sentidos estes  de natureza intelectual, mais próximos da verdadeira essência da alma, que assim é afetada moderadamente.
O prazer  estético de ordem superior, se contrapondo ao prazer físico, que sendo ilimitado leva ao desequilíbrio e insatisfação permanentes.

O Belo em termos moral - Diz respeito às almas equilibradas, em perfeita harmonia, ocupando o meio termo entre a virtude e o vício, a real medida do Belo.

O Belo em termos espirituais - a verdade alcançada através do conhecimento teórico, que uma vez conquistada possui a própria Beleza, a própria essência do Belo.

As Artes estariam dentro da concepção do Belo estético, subordinada, portanto, às outras duas concepções de beleza; a moral e a intelectual.
A beleza estética acalmando as paixões criam uma predisposição para a prática das virtudes, favorecendo o objetivo moral da Beleza, que seria a moderação e a prática das belas ações, que levam ao belo espiritual, a forma mais elevada de beleza.
Somente uma alma capaz de realizar belas ações, dedicada à vida contemplativa pode ascender à verdadeira beleza do Ser.

Na obra "O Banquete", Platão descreve o percurso  do amor em direção à Beleza ética e moral, um meio pelo qual podemos chegar ao  Bem e ao Belo e demais virtudes.
Somente depois de ultrapassarmos o amor primário e vil é que nos tornamos aptos para amar as almas e não os corpos  e assim,  atingimos  o Belo supremo, a verdadeira Beleza.

Sócrates afirmava que nada escapa às imperfeições. Para que o artista reproduzisse coisas belas, próximas do ideal de Belo, teria que recorrer à reunião de várias belezas espalhadas na Natureza.
A Beleza ideal como a reunião dos fragmentos que compõem a Natureza caminhando no sentido da desordem para a ordem. Para que encontremos a Beleza é necessário caminhar pela estrada do conhecimento.

Para os filósofos gregos, a poesia, a pintura, a escultura e até mesmo a música eram consideradas Artes miméticas.

A mimese em Sócrates foi objeto de reflexão, documentada por Xenofonte, durante uma rápida conversa com o pintor Parrásio e o escultor Cleito.
Ele conclui que quando o pintor e escultor reproduzem a aparência exterior dos corpos será preciso que o artista reúna as partes belas de vários objetos da mesma espécie para que forme então, algo perfeito.
Se o artista pode reconhecer as coisas que são belas, associando as partes entre si num modelo ideal, isso prova que já existe em sua mente a ideia de Beleza, e na verdade, o pintor e escultor não imitam o modelo, mas sim, o idealizam.

Para Platão, o pintor e escultor imitam as coisas do  mundo, que por sua vez já são cópias da realidade perfeita, sendo assim, inconsistentes e ilusórias as suas obras. As Artes apenas imitam as coisas do mundo sensível, reproduzindo não mais do que apenas a aparência, uma simulação de uma realidade que não possuem.

Em relação à música, Platão relaciona determinados modos harmônicos com sentimentos específicos, qualificando os ritmos com uma escala de atitudes. Existem ritmos que imitam a baixeza e desregramento, assim como harmonias que são patéticas, melancólicas, outras ainda, entusiásticas, energéticas e marciais.
A música exteriorizando afetos e sentimentos humanos. Uma imitação de um conteúdo psíquico e moral, através das combinações de sons.

Para Aristóteles não haveria nenhum sentido a simples cópia ou duplicação de uma imagem de um ser individual. O artista não deve reproduzir traço a traço todas as peculiaridades  do que está representando, mas sim,  as características gerais, inclusive acrescentando tudo que falte à coisa para que esta seja  o exemplar de sua espécie ou categoria.
Assim, o artista não imita o individual ou as coisas como são, mas como devem ser, conforme os fins que a Natureza se propõe a alcançar.

Aristóteles usa o termo Verossimilhança, aceitando a aparência não como algo completamente real, nem como ilusão. Se a Natureza  tem falhas, imperfeições e deficiências, a Arte tem condições de  eliminar e corrigir esses erros.

A imitação também se estende às coisas desagradáveis à vista, repelentes e ameaçadoras, que através da Arte sofrem uma transfiguração em seu aspecto natural, tornando-se atraentes. É que o Belo na Arte não coincide com a beleza exterior dos objetos representados, mas sim, com a maneira de representar as coisas ou ações, a natureza e o homem.

Sandra Honors
Fonte:  Introdução à filosofia da Arte - Benedito Nunes.




Platão - A Arte e o Belo









Platão em seu diálogo, "A República", conclui estar a pintura e a escultura abaixo da
verdadeira Beleza, sendo supérfluas se comparadas aos objetivos da ciência, uma vez que sua produção é inconsistente e ilusória.

Para o filósofo, o Belo, como valor atribuído às coisas, deriva da "Beleza Universal". As coisas são belas na medida em que participam da beleza transcendente, que se comunica com o mundo sensível - mundo material - transmitindo-lhes qualidades, que na realidade pertencem ao mundo inteligível das ideias, ao mundo das essências imutáveis. Só as essências existem verdadeiramente. A imutabilidade é o sinal que distingue a realidade e perfeição, daquilo que é falho, em permanente mudança.

O pintor e o escultor imitam as coisas do mundo, que por sua vez, já são cópias da realidade perfeita. Imitam a aparência sensível, ilusória, enganadora, simulando uma realidade que não possuem efetivamente.

Para Platão, se o artista fosse verdadeiramente sábio, ele não trocaria a realidade pela aparência, enredando a alma para o engano e equívoco.
Não há razão para o artista reproduzir formas que são inferiores - uma vez que já são cópias de uma realidade perfeita - reproduzindo apenas o mundo da aparência.

Até mesmo o artesão estaria em contato mais próximo com o mundo inteligível, quando trabalha com a matéria dando-lhe uma forma - por exemplo, quando concebe a forma de um leito - pois essa forma participa da ideia universal de todos os leitos possíveis, ao contrário do pintor e escultor que reproduzem uma figura singular, de um objeto sensível.
O artesão fabrica objetos úteis, que imitam certas essências, enquanto a pintura e a escultura reproduz as coisas mutáveis do mundo sensível, cuja beleza é precária e ilusória.

Além da reflexão acerca da Arte e Realidade, Platão também observa que a poesia e a música exercem grande influência emocional, afetando o comportamento dos homens, tanto positiva, como negativamente, quando esta se rebaixa a reproduzir aquilo que intranquiliza a alma e prejudica a sua elevação.

Platão confere ao poeta um status maior, acima dos artífices - tanto artesãos, como pintores e escultores . Considera a poesia a arte máxima, aquela que maior afinidade possui com a inteligência e atividade do espírito e com a verdadeira beleza.
Platão atribui à poesia uma dignidade e função específica, situando-a no domínio das revelações místicas e filosóficas.
Considera esta - a poesia - veículo de conhecimentos extraordinários, inacessíveis à maioria dos homens, equiparando a figura do poeta a de um adivinho ou profeta, onde as poesias épicas ou líricas são concebidas e escritas sob ação direta da divindade, e portanto, não pertencentes à categoria de "póiesis", mas sim à categoria religiosa do "delírio", seja como manifestação divinatória, purificação do corpo e da alma, ou como inspiração das Musas.

O delírio do poeta transmite aos ouvintes o entusiasmo, despertando-lhes reminiscências da beleza universal, conhecida da alma, quando no reino das essências, de onde surgiu e da qual se apartou para ser aprisionada ao corpo.
Assim, a poesia instiga essas lembranças, reacendendo o desejo de retorno ao mundo inteligível, pátria original da alma.


Sandra Honors



Fonte: Introdução à filosofia da Arte - Benedito Nunes





Erwin Panofsky







Um dos principais representantes do chamado método iconológico, em que define três momentos inseparáveis do ato interpretativo das obras em sua globalidade:. Ele estabelece três níveis de interpretação da obra:


1) Nível primário ou natural,
2) Segundo nível, ou nível secundário,
3)Terceiro nível, ou significado profundo.


No nível primário, identificamos as formas, as configurações de linha e cor, determinados pedaços de bronze, ou pedra . O mundo das formas puras, que trazem em si significados naturais. É o que se poderia chamar de mundo dos motivos artísticos.


A compreensão e exposição desses motivos corresponde para o autor, a "descrição pré- iconográfica.
Temos nessa etapa uma descrição, que dependeria basicamente da nossa experiência prática.
Qualquer pessoa poderá reconhecer a forma e o comportamento dos seres humanos, animais, plantas, como também, distinguir diversos estados e humores.


No caso de nos depararmos com algo pouco familiar, ou desconhecido, teríamos que ampliar o alcance de nossa experiência prática, consultando bibliografias,consultando peritos, etc.
De qualquer forma, nossa experiência prática pode não garantir a exatidão de nossa descrição iconográfica, motivo pelo qual Panofsky recorre à história dos estilos como um instrumento corretivo deste primeiro nível.


Por exemplo, numa descrição pré- iconográfica da obra de Roger van der Weyden " A visão dos três Reis Magos". O que nos dá a certeza de que a criança que paira no céu é uma aparição?
Os halos dourados não servem como explicação, pois o Meninos Jesus também é representado com esse halo em outras obras, onde é certo tratar-se de uma criança real e não uma aparição.


O fato de estar pairando no ar, também não pode ser considerada uma explicação certa, pois comparando essa obra a uma miniatura dos Evangelhos de Oto III, uma cidade é representada pairando no ar, mas não se trata de uma aparição, senão a cidade propriamente dita.Trata-se mesmo da cidade de Naim, onde Cristo ressuscitou o jovem. O fato é que a cidade foi representada fora de uma representação de espaço realista, com respeito às leis de perspectiva, etc.. Não há neste caso nenhuma conotação miraculosa nessa cidade suspensa no ar. Temos portanto que localizar as variações das formas de representação conforme as condições históricas. Esse princípio corretivo é o que podemos chamar de história dos estilos.


Se o nível primário, ou tema natural corresponde à descrição pré iconográfica da obra, ou ao mundo dos motivos, o segundo nível poderá ser apreendido, quando associamos ao primeiro um conceito, um significado determinado por uma convenção.
Esses motivos são chamados de "imagens", ou, se são uma combinação de imagens, "alegorias", ou "estórias", onde se analisa a figuração iconograficamente.
Aqui estão presentes a intenção consciente do artista, mesmo que certas qualidades expressivas não sejam intencionais.
Para esse nível de análise, serão necessários mais do que apenas a experiência prática, pois se fará necessário conhecimentos sobre temas específicos e conceitos.


Esse conhecimento poderá ser adquirido por fontes literárias, ou ainda pela tradição oral.
Neste nível, Panofsky aplica um instrumento corretivo, que é a história dos tipos.
Assim, no tema secundário, ou convencional, há a percepção de que um grupo de pessoas sentadas ao redor de uma mesa, numa determinada posição representa a última ceia. Ou ainda, que uma figura masculina segurando uma faca representa São Bartolomeu. Mas, algumas vezes precisaremos recorrer ao instrumento corretivo neste nível de análise,que é a já citada, história dos tipos.


Um exemplo que ilustra esse fato foi o erro na análise iconográfica da pintura de Francesco Maffei, onde observamos uma jovem segurando uma espada e uma bandeja com a cabeça de um homem degolado. A bandeja com a cabeça poderia nos levar a acreditar tratar-se de Salomé. Mas, a espada é atribuída à Judite, que ao decapitar Holofernes,coloca sua cabeça em um saco.
Segundo Panofsky, se compararmos os tipos com as pinturas do século XVI, poderemos verificar que a bandeja está presente em várias representações de Judite. Porém, não havia um "tipo" de Salomé com a espada. Daí podermos concluir que a obra de Maffei representa Judite e não Salomé, como já havia sido pensado.



Francesco Maffei "Judite"
Desta forma, através da verificação e investigação da maneira pela qual, em condições histórias determinadas, os objetos e fatos eram expressos e representados, podemos ter uma análise iconográfica mais exata.

Por fim, chegamos ao terceiro nível , ou significado intrínseco de uma obra. Este significado nos é dado pela determinação de princípios subjacentes que revelam a atitude básica de uma nação, de um período, de uma classe social, crença religiosa, ou filosofia. A interpretação iconológica, onde o pesquisador investiga outros documentos,que sirvam de testemunhas de tendências políticas, religiosas, sociais,filosóficas,do país e do período em questão. Esses elementos formam chamados "valores simbólicos" por Ernst Cassirer, e é justamente a interpretação desse valores simbólicos que seriam o objeto da iconologia.

Sandra Honors


Fonte:

Estudos de Iconologia - Temas Humanísticos na Arte do Renascimento

As teorias da Arte - Jean Luc Chalumeau
Guia de história da Arte - Giulio Argan e Maurizio Fagiolo






Aby Warburg


Enquanto o método formalista de estudo da história da arte - que teve em Heinrich Wölffin ( 1864 - 1945) o seu maior expoente - se interessa, não pelos conteúdos da arte, mas sim, pelas formas - a metodologia de Aby Warburg (1866 - 1929), considera as imagens um fenômeno antropológico total, onde as motivações para o seu surgimento estariam relacionadas a uma memória coletiva.
Segunda Warburg, seria possível acompanhar o deslocamento histórico e geográfico das imagens. Essas estariam ligadas a realidades culturais específicas, relacionadas a determinada época e a determinado lugar, no entanto, elas refletiriam problemas e inquietações, e movendo-se pelo tempo e espaço, reapareceria incessantemente, como "vida em movimento", cujos traços importantes e significativos estariam inscritos na memória da humanidade.
A imagem, para Warburg seria uma formação simbólica que traz a memória de uma origem que a carregou de energia e através da qual ela sobrevive nas suas manifestações históricas.
A questão da sobrevivência de formas de um tempo passado para outro, já tinha sido abordado por Warburg em seus estudos de doutorado em História da Arte, sobre Botticelli.
Nesses estudos, ele investiga acerca da utilização de formas clássicas durante o renascimento italiano.
Ele observa, então, a preocupação de Botticelli em dar um movimento acentuado às vestes e cabelos das figuras femininas, nas obras, "O nascimento de Vênus" e " A primavera". Constata que as modelos foram tiradas de sarcófagos greco-romanos com figuras de ninfas, e que o exagero e a ênfase nos movimentos já citados, não condiziam com o naturalismo que se buscava durante esse período.
Haveria, portanto, segundo o historiador, uma motivação psicológica, que justificaria a reutilização de formas antigas, em plena cultura dos "quattrocentos".
À partir dessas constatações, passa a desenvolver seus estudos que resultariam nas suas concepções sobre a transmissão da cultura de uma memória coletiva através de uma imagem.
Dando continuidade a seus estudos, Warburg desenvolve seu projeto "Mnemosyne", organizando em pranchas, fotografias que segundo ele, sintetizavam sua ideia acerca da função psicossocial das imagens.
Para Warburg, o tempo da imagem não seria necessariamente o tempo da história, o que não seria compatível com um modelo de evolução, o que colocava em xeque toda uma tradição que nascera com Vasari e fora continuada por Winckelmann, segundo a qual, haveria na arte um período de progressão seguido de uma decadência.
Warburg transforma sua biblioteca em um Instituto , cujo foco é a influência da antiguidade clássica na civilização europeia, defendendo uma abordagem interdisciplinar, dando início a uma nova maneira de entender a história da arte. O Instituto continua com Fritz Saxl, que o transforma em instituto de pesquisa, com representantes de diversas disciplinas. Em um primeiro momento, o Instituto era filiado a Universidade de Hamburgo, mas com o Nazismo, mudou-se para Londres.
Vinculados ao Instituto figuram nomes como Erwin Panofsky, Fritz Saxl e Gombrich.

Sandra Honors


Referências:
Guia da História da Arte - Giulio Argan
Aby Warburg e os arquivos da memória - Antônio Guerreiro
As imagens sem memória e a esterilização da cultura - Antônio Guerreiro







Método Formalista      
                                            




Partindo da Teoria da "Pura visibilidade", o método  formalista de estudo da história da arte tem em Heinrich Wölfflin um dos seus grandes expoentes.
Wölfflin não se interessa por temas ou motivos da arte. Para ele, no estudo da  história da arte, as formas expressam  o estado de espírito de uma época e de um povo.
Ao lado do estilo pessoal encontra-se o estilo da escola, o estilo do país, o estilo de uma cultura.
De acordo com o autor, o Renascimento italiano é caracterizado pelo ideal da proporção perfeita, do completo, limitado e concebível.  Já o Barroco oferece o ideal do movimento, da emoção, aquilo que é mutável e ilimitado.
“... Seu  objetivo não é analisar a beleza da obra de um Leonardo ou de um Dürer, e sim o
elemento através do qual esta beleza ganhou forma. Ele também não tenta analisar a
representação da natureza de acordo com o seu conteúdo imitativo, nem em que
medida o naturalismo do séc. XVI difere daquele do séc. XVII, mas sim o tipo de
percepção que serve de base às artes plásticas no decorrer dos séculos.”
(WÖLFFLIN, 2006: 17)
Procura em seus estudos estilísticos da arte clássica do século XVI e da arte barroca do século XVII definir as maneiras pelas quais se organizam em torno de 5 pares de conceitos  fundamentais:
1) Linear/pictórico
2)Plano/profundidade
3)Forma fechada/forma aberta
4) Multiplicidade/unidade
5) Claridade/ obscuridade

Linear e Pictórico:
Nos artistas clássicos, segundo Wölfflin,existe uma valorização da linha; as massas de luz e sombra encontram-se dentro de limites precisos, claros e pormenorizados - estilo linear.
No barroco, por outro lado, não conseguimos delimitar com precisão  o contorno das formas, cujas imagens são mais claramente perceptíveis se vistas a uma certa distância.A  imagem é oscilante e sem limites, o objeto é retratado em seu contexto.

Plano e Profundidade:

A disposição dos planos é paralela nas pinturas clássicas, que  dispõe os objetos em camadas planas, a fim de dar maior clareza ao que está sendo retratado. Enquanto que na arte barroca os planos são constituídos por uma linha diagonal.

Forma fechada e forma aberta:

Nas pinturas clássicas existe um equilíbrio em torno de um eixo central, ao passo que no barroco esse eixo inexiste e os objetos e pessoas são na verdade um fragmento, um instante passageiro casualmente extraído do mundo visível.

Multiplicidade e Unidade:

No clássico, cada objeto, cada personagem está individualizada, podendo o observador destacar mentalmente cada um deles separando-os do conjunto.
No barroco, cada forma isolada nos remete imediatamente ao conjunto, a uma visão global, não podendo ser destacados individualmente. há uma fusão das figuras em um todo homogêneo e indivisível, no qual é quase impossível destacar formas isoladas.

Claridade e Obscuridade:

No barroco a luz ao mesmo tempo mostra e esconde e nem tudo está explícito como na pintura clássica, onde todas as formas estão visíveis até a extremidade.
No estilo barroco,  o artista ao valorizar a sombra, confere à obra um tratamento expressivo e sentimental, ao passo que a pintura clássica puxa mais pelo intelecto, justamente pela sua clareza e "legibilidade".

Sandra Honors

Referência:
 Conceitos Fundamentais da História da Arte. - Heinrich Wölfflin
As teoria da arte - Jean Luc Chalumeau





Teoria da Visibilidade Pura
Escola de Viena
   


                                                             

Segundo essa corrente de estudo, a arte deve ser primeiramente analisada, não como a história da evolução técnica, ou ainda como reflexo de um contexto sócio político, ou como a história de   artistas individuais, mas sim, pelos aspectos formais típicos de um período.

A história da arte seria a história dos estilos, onde a forma presente em todos, ou quase todos  os artistas de um mesmo tempo, ou de uma mesma corrente estilística, possui um conteúdo próprio, que nada tem a ver com o tema histórico, mitológico ou religioso da obra.

A forma como um sistema de representação global, uma concepção de mundo e do espaço de uma determinada época, período, escola, enfim, de um mesmo âmbito cultural.

Segundo Argan, em seu guia de história da arte, se tomarmos, por exemplo, um quadro de Rafael  representando Nossa Senhora  com o menino numa paisagem, o que haveria de especial na obra? Existem várias obras com esse tema, cujo sentimento manifesto não se distancia muito deste quadro em questão.

Pois bem, se tiramos  o tema e os conteúdos afetivos  como, a terna solicitude da mãe, a despreocupação da criança, a paisagem serena e suave, verificaremos, por exemplo, que as figuras formam uma pirâmide, que se contrapõem a um vazio atmosférico de fundo, onde as linhas dos contornos se harmonizam com  as curvas delicadas da paisagem, etc.

Essas são características formais dessa  obra, e  que estão presentes em todas as madonas  de Rafael, não apensas nesta.  E ainda, presentes em outras obras do mesmo período, independente do tema , e que portanto, mostram algo mais geral e profundo, como uma concepção de mundo e do espaço, como uma representação global da realidade.

As formas como tendo um conteúdo significativo próprio, para além de um tema que comunicam, seja ele , histórico ou religioso.

Desaparece nessa análise, portanto,  qualquer conceituação sobre  apogeu ou decadência, ou ainda, de superioridade de um estilo em relação àquele que o precedeu, pois inexiste aqui, uma visão mecanicista de evolução técnica e material  da arte.

Sandra Honors

Bibliografia:
Por uma bibliografia comparada da arte - José Costa D'assunção Barros
Guia de História da Arte - Giulio Argan


Leveza - Seis propostas para o próximo milênio

Core Perséfone OST - Sandra Honors



Ao ser convidado a fazer as “Charles Eliot Norton Poetry Lectures, que seriam desenvolvidas ao longo do ano de 1985-86, na Universidade de Harvard, Cambridge, Ítalo Calvino decide-se por tratar de valores literários que mereciam ser preservados no curso do novo milênio que se aproximava.
Valores como, Leveza, Rapidez, Exatidão, Visibilidade e Multiplicidade. O sexto valor, “Consistência”, não chegou a ser desenvolvido, nem foram realizadas as conferências, devido sua morte prematura.
Dessas conferências surge o livro, ”Seis propostas para o próximo milênio”, cujo primeiro ensaio é a Leveza.



Leveza:



Calvino afirma, que depois de 40 anos escrevendo ficção, reconhece que seus esforços sempre foram no sentido de subtrair o peso das figuras humanas, do ambiente, das estruturas narrativas e da linguagem.
Talvez perseguisse o ideal do poeta italiano Giacomo Leopardi, cujo milagre, segundo Calvino, “consistiu em aliviar a linguagem de todo o seu peso, até fazê-la semelhante à luz da lua” (Calvino, 1990 p.36)


Reconhecendo a leveza sempre como uma oposição ao peso, ele esclarece que diante da inércia e petrificação do mundo, devemos sempre, à maneira do herói Perseu, que vence a monstruosa Medusa, observando-a através do reflexo de seu escudo, buscar uma visão indireta das coisas, procurar outros ângulos, outras perspectivas acerca do mundo, sem que com isso recusemos a realidade.


Calvino encontra nesse mito uma alegoria da relação do poeta com o mundo.
“À maneira de Perseu eu deveria voar para outro espaço. Não se trata absolutamente de fuga para o sonho ou o irracional. Quero dizer que preciso mudar de ponto de observação, que preciso considerar o mundo sob outra ótica, outra lógica, outros meios de conhecimento e controle” (Calvino 1990 p.19).


Com o poeta e filósofo Lucrécio, descobrimos um mundo constituído de pequenas partículas, infinitamente minúsculas, móveis e leves. O poeta dissolve a compacidade do mundo; já em Ovídio, com suas fábulas mitológicas, percebemos os tênues envoltórios que diferenciam a diversidade de cada coisa, todas constituídas de uma mesma substância, que se transformam se agitadas por uma profunda paixão.
Aqui encontramos a estrutura que poderá nos guiar em nossas escolhas:


- A existência da leveza sempre em oposição ao peso;


- O olhar atento, que sempre busca outros ângulos e outras perspectivas acerca do mundo, recusando com isso uma visão direta e óbvia das coisas (o peso), buscando, ao contrário, as sutilezas e elementos delicados (a leveza) que se opõem e resistem ao peso;


-A vida como matéria prima, como fonte de inspiração de toda criação, onde precisamos retirar-lhe o peso, dissolver sua materialidade para que possamos encontrar a leveza, ou ainda, perceber o movimento das coisas e de sua continua passagem de uma coisa a outra.




Em “Picolo Testamento” de Eugenio Montale, ele aponta a maneira deste poeta extrair elementos delicados de um universo árido e apocalíptico, onde se reconhece a “fé na persistência do que há de mais aparentemente perecível, e nos valores morais investidos nos traços mais tênues”. (Calvino, 1990 p. 18).


Em Milan Kundera (A Insustentável leveza do Ser) Calvino reconhece a vivacidade e a mobilidade da inteligência, como talvez, as únicas qualidades capazes de escapar da condenação ao peso.




Visitando Boccaccio, em Decamerão, nos deparamos com o poeta Guido Cavalcanti, que segundo Calvino, oferece a imagem que deveria ser o reflexo do novo milênio.” O salto ágil e imprevisto do poetafilósofo, que sobreleva o peso do mundo, demonstrando que a sua gravidade detém o segredo da leveza, enquanto aquela que muitos julgam ser a vitalidade dos tempos, estrepitante e agressiva, espezinhadora e estrondosa, pertence ao reino da morte, como um cemitério de automóveis enferrujados” (Calvino 1990 p.23).


Calvino nos diz ainda que, ao se deter em Cavalcanti, fica claro que a leveza está associada à precisão e a determinação, nunca ao que é vago e aleatório. (Calvino 1990 p28).

O próprio Cavalcanti, em seus poemas, nos dá três acepções distintas que exemplificam a leveza:
· “Um despojamento da linguagem por meio do qual os significados são canalizados por um tecido verbal quase imponderável, até assumirem essa mesma rarefeita consistência”.
· “A narração de um raciocínio ou de um processo psicológico no qual interferem elementos sutis e imperceptíveis, ou qualquer descrição que comporte um alto grau de abstração”.
· “Uma imagem figurativa da leveza que assuma um valor emblemático”.


De Guido Cavalcanti, Calvino nos leva à Renascença Shakespeariana com sua filosofia oculta, rica em imagens que simbolizam as forças naturais e sutis da natureza.


Seguindo adiante, nos deparamos com a célebre imagem de D. Quixote, de Cervantes, cravando a lança de um moinho de vento.


Calvino cita também Cyrano de Bergerac, que nos mostra “como faltou muito pouco para que o homem não fosse homem, nem a vida a vida e nem o mundo um mundo” (Calvino 1990 p.32).


Depois de conhecermos um pouco as aventuras do Barão de Munchhausen e de seu desafio às leis da gravidade, seguimos para o final, ilustrado com um conto de Franz Kafka “O Cavaleiro da Cuba”.
Com essa imagem, Calvino nos afirma que “iremos ao encontro do próximo milênio sem esperar encontrar nele dada além daquilo que seremos capazes de levar-lhe. A leveza, por exemplo, cujas virtudes esta conferência procurou ilustrar” Calvino 1990 p44).


Sandra Honors 2012













"Afrodite" OST - Sandra Honors
Resgate do Feminino




Escavações arqueológicas e relatos históricos evidenciam que, o papel da mulher nas sociedades arcaicas era imensamente diverso deste que veio a assumir com o início do cristianismo.
Antes da supremacia da racionalidade e do patriarcado, a mulher era a figura central nas sociedades arcaicas, ao redor da qual regras e valores majoritariamente se estabeleciam. As relações de parentescos, por exemplo, eram determinadas pela matriarca das famílias. Em épocas em que a terra era cultuada como fonte da vida e da prosperidade o ser humano estabelecia uma relação de respeito profundo com seus ciclos, pois essas sociedades arcaicas dependiam principalmente de seus frutos para sua sobrevivência.
Nossos mais remotos ancestrais procuravam ordenar suas vidas e o mundo através da observação destes ciclos da natureza; encontravam na vida externa uma ordenação sagrada para sua própria vivência interna. Passando a compreender que aquilo que se mostra ao redor esta em ressonância com aquilo que vivenciam em seu interior. Ou seja, o microcosmo reflete as ordenações cíclicas do macrocosmo.
Diante desta realidade não fica difícil imaginar o motivo das mulheres serem cultuadas em Vênus cuidadosamente esculpidas ou o de terem seus órgãos genitais expostos em alguns templos religiosos do oriente.
Ao feminino cabe colocar em marcha o principio da criação; a gênese inicia-se em seu ventre. Assim, a mulher é o centro e no ventre está seu maior poder, o poder de gerar.
O ventre é simbolicamente representado pelo jarro, pela taça sagrada, pelo caldeirão alquímico de onde a vida tem início. Além disso, sua estreita relação com os ciclos periódicos da natureza aumenta o mistério que permeia o feminino, como a lua e as marés, está em constante transformação. Seu sangue a renova, a purifica, a vivifica e, principalmente, cria um contato único com a Mãe Terra.
Sem a pretensão de aprofundar-se no tema, mas a título de seqüência histórica, temos o início e a difusão do cristianismo. Marco histórico em que o poder do feminino passa a ser punido, pois agora o homem cinde os valores terrenos dos espirituais, criando um abismo entre o simbolismo do céu (patriarcal) e da terra (matriarcal), onde tudo que a esta estivesse relacionado seria subjugado às mais escuras masmorras do inconsciente. A mulher passa a ser a representação daquilo que o homem teme: a sexualidade, o carnal, o material, a magia e a obscuridade dos sentimentos.
São caçadas, são mortas e condenadas. Os homens caçam, matam e condenam a si mesmos. Projetam no exterior aquilo que não conseguementender dentro deles mesmos, sentem que seus ideais religiosos e morais podem ser destruídos frente a tais tentações, frente à tentação da comunhão entre os aspectos contraditórios de sua própria personalidade.

Do Sagrado faz-se um abismo, separação entre alma e carne. Entre masculino e feminino. Entre sagrado e profano. Entre o homem e a sua completa humanidade.

Autores como o psicólogo Carl Gustav Jung defendem que no inconsciente de cada pessoa repousa a história de toda a humanidade, assim, nossas ações e nossos anseios não apenas relacionam-se com nossa própria história de vida. Em cada escolha que fazemos subjaz a centelha de toda nossa ancestralidade, todo percurso que até aqui descrevemos está, de certa forma, gravado em nossa memória.
Ainda tocando a superfície da contextualização histórica, avançamos para o advento dos movimentos feministas e ecológicos, que desencadearam uma revolução dos valores vigentes, principalmente nas sociedades ocidentais. Pouco a pouco o feminino retoma sua importância dentro do contexto histórico atual.
Neste momento da história estamos em meio a um processo de resgate, não apenas de valores, mas um resgate mais profundo. O resgate do sentido do Sagrado na mulher, do Feminino Divino que alenta cada respiração, cada movimento, cada intenção em seu Ser.
A mulher encontra diversas maneiras de celebrar esta união consigo mesma, e um destes caminhos pode ser construído através da vivência da dança. O dançar anima nossa alma, seus movimentos nos trazem a liberdade de Ser e sentir.
Diante disso, somos levados a compreender que a procura pela dança, mais especificamente a dança do ventre, não se dá de maneira aleatória ou apenas pela busca do bem-estar, mas sim como um profundo e arraigado anseio pela União consigo mesma, para o despertar do divino em cada feminino que dança e (re-) anima a si mesma.
Mover o ventre é mover a própria historia da humanidade, é trazer luz ao poder do feminino que fora acorrentado nas camadas mais obscuras de nosso inconsciente e do inconsciente coletivo. É ser o próprio recipiente da força e da exuberância da vida.

Mover o ventre é resgatar a inteireza de Ser da Mulher.
*

Sugestões de leitura sobre o tema:
AMAR, M. Dança do ventre, a mais feminina das artes. Inhttp://www.aomestre.com.br/alt/ventre.htm

ENGELS, F. A origem da família, da propriedade privada e do estado. Brasil : Presença, 1976.
JUNG, C.J. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. Petrópolis: Vozes, 2000.


KARPINSKI, G.D. As sete etapas de uma transformação consciente: ritos espirituais de passagem. São Paulo: Pensamento, 1997.


TAYLOR, T. A pré – história do sexo: quatro milhões de anos de cultura sexual. Rio de Janeiro: Campus, 1997.

Fonte:http://lucianafesti.multiply.com/journal/item/6








Medusa OST Sandra Honor
Medusa

A origem serpentínea de Athena aparece ocultada na lenda da Medusa que foi transformada pelo patriarcado na terrível górgone cujo olhar petrificava os homens.
Na realidade Medusa era neta de Gaia, seu nome significava Senhora ou Rainha, sendo a deusa serpente das Amazonas da Líbia, uma das três irmãs górgones cujo cabelo encaracolado era semelhante a uma coroa de serpentes. Elas protegiam os mistérios matrifocais antigos e os limites dos lugares sagrados. Em uma inscrição antiga Medusa era chamada “Mãe dos Deuses, passado, presente, futuro, tudo o que foi, é e será” (frase posteriormente copiada pelos cristãos para definir Deus). Sua sabedoria era resumida nesta frase: “nenhum mortal foi capaz de levantar o véu que Me oculta”, por Ela ser a própria morte, sendo o aspecto destruidor da deusa tríplice. Outro significado da sua face oculta e perigosa era o tabu menstrual, pois os povos antigos temiam o poder mágico do sangue menstrual, que podia criar e destruir a vida. A serpente é um antigo símbolo da sabedoria feminina e também representa o poder da energia Kundalini, a capacidade de transmutação e regeneração.
Originariamente a cabeça da górgone era encontrada na entrada dos templos como um escudo de proteção, a górgone arcaica representando uma trindade lunar formada por sabedoria, força e proteção. A lenda conta que o sangue de Medusa - que tanto servia para curar como para matar - foi colhido dos seus dois lados (esquerdo e direito) colocado em duas ânforas e dado a Asclépio e à sua filha Hygéia, deuses da cura. A imagem das duas serpentes entrelaçadas existente no caduceu (o bastão das divindades de cura) simboliza o conceito de vida e morte, a polaridade masculino/ feminino, esquerda/ direita, a representação da hélice dupla do DNA. Os antigos símbolos da deusa serpente minoana sobreviveram na ordem patriarcal apenas no seu aspecto escuro e ameaçador (principalmente para os homens, que ficavam paralisados pelo poder do olhar da Medusa).
Um mito antigo atribui à Medusa o nascimento de Pégaso, o cavalo alado, como fruto da sua união com Poseidon, ambos metamorfoseados em eqüinos (cavalo e égua). Outro mito mais recente descreve sua criação do sangue jorrando do pescoço de Medusa quando a sua cabeça foi cortada pela espada brilhante de Perseu. A vitória de Perseu é vista como uma ode à vitória da luz sobre os terrores da escuridão e das serpentes, reforçando assim a dicotomia entre luz e sombra, masculino e feminino, Sol e Lua.




fonte do texto:http://sagrado-feminino.blogspot.com/2009/10/athena-e-medusa-dois-nomes-mesma-deusa.html










Fenix


Fenix OST - Sandra Honors

Basta pensarmos na pomba, na fénix, na águia, no falcão, etc.. É um dos símbolos mais poderosos da liberdade e da expansão da consciência. Dado que designa um ser que voa, é um símbolo utilizado para exprimir, de forma privilegiada, a relação entre o céu e a terra, entre o espírito e a matéria, entre o plano horizontal e o plano vertical.
Em grego, por exemplo, a palavra ave é sinónimo de presságio e de mensagem do céu. As aves simbolizam, pois, os estados superiores dos seres, daqueles seres que se libertaram do peso terrestre, e que assim ascenderam ao transcendente. Neste contexto, importa realçar a importância fundamental do voo, enquanto imagem da ânsia de ascensão, de verticalidade e de transcendência.
No Alcorão, o conhecimento espiritual, a verdadeira Sabedoria são designados por “língua das aves”. Na tradição hindu, a ave era um símbolo da amizade entre os deuses e os homens e, no Egipto antigo, representava a alma do defunto.
A pomba é, entre os cristãos, um dos símbolos da pureza, da paz, e a representação inequívoca do Espírito Santo. Recordemos que, no início do Génesis, o espírito de Deus se movia, como uma ave, sobre a superfície das águas primordiais.
A mais antiga demonstração da crença em almas-aves está, sem dúvida, contida no mito da Fénix. Designada como a ave de fogo, cor de púrpura (isto é, composta de força vital, solar), representava a alma para os egípcios. Segundo a lenda, após ter vivido muitos anos, a Fénix teve a coragem de se incinerar numa fogueira, regressando à vida mais bela e mais pura.
Os aspectos do seu simbolismo surgem aqui claramente: para que possa haver uma renovação da vida, é necessário que morram os aspectos mais negativos da psique humana. O homem novo só pode surgir quando tiver, em cada um de nós, morrido o homem velho.
Também a águia está presente em inúmeras tradições, simbolizando a realeza de Deus. É a rainha das aves, encarnação, substituto ou mensageira da mais alta divindade uraniana, e do fogo celeste, o sol, que só ela ousa fixar sem queimar os olhos. O ceptro de Zeus, pai dos deuses da antiga Grécia, era encimado por uma águia. Identificada com Cristo, esta ave exprime também a sua ascensão e realeza deste.
Na tradição iraniana, por exemplo, o falcão, ou a águia, simbolizavam o poder divino. Quando um rei lendário do Irão proferiu uma mentira, o poder divino abandonou-o sob a forma de um falcão. Nesse preciso momento, o rei viu-se despojado de todos os seus atributos, tendo sido, mais tarde, vencido pelos seus inimigos. E assim perdeu o trono.


Fonte: http://sonharsimbolos.wordpress.com/2007/10/26/a-ave/















Athena



Athena OST - Sandra Honors
Na arte clássica grega existem duas diferentes apresentações de Athena. A imagem mais familiar é a da deusa severa, paramentada com armadura, elmo e escudo, a virgem invicta e guardiã de Atenas, que protege as batalhas e os heróis. Já a mais antiga a mostra como uma deusa majestosa, com o manto e os cabelos decorados com serpentes e um fuso na mão esquerda. No entanto, mesmo a figura guerreira guarda as memórias arcaicas da sua verdadeira origem, que aparecem na cabeça da górgone com cabelos de serpentes, existente no seu escudo chamadoGorgoneion. Esta é a revelação da descendência de Athena, herdeira da deusa minoana das serpentes, cultuada um milênio antes do mito patriarcal transformá-la na filha nascida da cabeça do seu pai Zeus, surgindo totalmente armada e pronta para a batalha

Os mitos mais recentes descrevem a górgone como um monstro atemorizador, vencido e morto pelo herói Perseu, que após decapitá-la, entregou à deusa Athena sua cabeça como gratidão pela ajuda recebida.

Analisando detalhes do seu nascimento descobrimos que a mãe de Athena era a deusa Metis, uma das esposas de Zeus, que a engoliu, temendo que o filho que ela carregava no ventre pudesse destroná-lo, assim como ele tinha feito com o seu progenitor Chronos. Sofrendo de atrozes dores de cabeça Zeus pediu ajuda ao deus ferreiro Hefaisto, que lhe abriu a cabeça com seu machado e dela emergiu Athena, defensora da ordem patriarcal e não sua opositora. É evidente a metáfora que descreve o predomínio do direito paterno e patriarcal sobre a antiga ordem da sociedade matrilinear e matrifocal.Vemos nisso uma semelhança com o nascimento de Eva da costela de Adão, o primogênito; tanto Eva quanto Athena sendo associadas a serpentes.

Em grego, Athena pode ser compreendida como A Thea, a Deusa, que também deu origem ao nome da cidade por Ela patrocinada. Seu segundo nome, Pallas, significa “virgem”, pois em nenhum mito é feita qualquer referência à sua condição de mãe, sendo sempre conselheira, protetora e amiga de heróis e reis.

Uma antiga imagem minoana do período neolítico a retrata como uma deusa alada e com cabeça de pássaro. A transformação de Athena, de uma deusa pássaro e serpente em uma deusa guerreira que negou a sua filiação materna, ocorreu ao longo dos dois milênios de influências indo-européias e orientais na Grécia. O nome da sua mãe – Metis – permaneceu no seu atributo “sabedoria” ou “aconselhamento prático”. A origem serpentínea de Athena aparece ocultada na lenda da Medusa que foi transformada pelo patriarcado na terrível górgone cujo olhar petrificava os homens.
Na realidade Medusa era neta de Gaia, seu nome significava Senhora ou Rainha, sendo a deusa serpente das Amazonas da Líbia, uma das três irmãs górgones cujo cabelo encaracolado era semelhante a uma coroa de serpentes. Elas protegiam os mistérios matrifocais antigos e os limites dos lugares sagrados. Em uma inscrição antiga Medusa era chamada “Mãe dos Deuses, passado, presente, futuro, tudo o que foi, é e será” (frase posteriormente copiada pelos cristãos para definir Deus). Sua sabedoria era resumida nesta frase: “nenhum mortal foi capaz de levantar o véu que Me oculta”, por Ela ser a própria morte, sendo o aspecto destruidor da deusa tríplice. Outro significado da sua face oculta e perigosa era o tabu menstrual, pois os povos antigos temiam o poder mágico do sangue menstrual, que podia criar e destruir a vida. A serpente é um antigo símbolo da sabedoria feminina e também representa o poder da energia Kundalini, a capacidade de transmutação e regeneração.
Originariamente a cabeça da górgone era encontrada na entrada dos templos como um escudo de proteção, a górgone arcaica representando uma trindade lunar formada por sabedoria, força e proteção. A lenda conta que o sangue de Medusa - que tanto servia para curar como para matar - foi colhido dos seus dois lados (esquerdo e direito) colocado em duas ânforas e dado a Asclépio e à sua filha Hygéia, deuses da cura. A imagem das duas serpentes entrelaçadas existente no caduceu (o bastão das divindades de cura) simboliza o conceito de vida e morte, a polaridade masculino/ feminino, esquerda/ direita, a representação da hélice dupla do DNA. Os antigos símbolos da deusa serpente minoana sobreviveram na ordem patriarcal apenas no seu aspecto escuro e ameaçador (principalmente para os homens, que ficavam paralisados pelo poder do olhar da Medusa).
Um mito antigo atribui à Medusa o nascimento de Pégaso, o cavalo alado, como fruto da sua união com Poseidon, ambos metamorfoseados em eqüinos (cavalo e égua). Outro mito mais recente descreve sua criação do sangue jorrando do pescoço de Medusa quando a sua cabeça foi cortada pela espada brilhante de Perseu. A vitória de Perseu é vista como uma ode à vitória da luz sobre os terrores da escuridão e das serpentes, reforçando assim a dicotomia entre luz e sombra, masculino e feminino, Sol e Lua.


fonte do texto:http://sagrado-feminino.blogspot.com/2009/10/athena-e-medusa-dois-nomes-mesma-deusa.html













Peséfone

Peséfone OST Sandra Honora
Uma filha, jovem e muito amada, é raptada de perto da sua mãe por um poderoso governante, conhecido pelos seus atos malvados. A mãe desesperada sai à procura da filha e descobre que o rapto tinha resultado de um acordo entre o supremo chefe religioso e o raptor, sendo que o primeiro era o pai da jovem e o segundo, seu tio materno. Determinada a buscar justiça, com a revolta e a dor devastando sua vida, a mãe inicia um longo e eficiente protesto contra as autoridades, que resulta na volta da filha, traumatizada, mas viva e forte o suficiente para transmutar a sua dolorosa vivência, aceitar e cuidar do seu filho, concebido na escuridão da sua prisão.”

Este relato - de um fato comum no nosso cotidiano atual - descreve a trama mítica de uma antiga história grega, que deu origem a um complexo ritualístico pagão, iniciado no segundo milênio a.C. e praticado durante pelo menos 1500 anos, até mesmo após o advento do cristianismo. A mãe descrita no drama era Deméter, a Deusa dos Grãos, cujas dádivas eram essenciais à sobrevivência humana; a filha era a donzela Kore, raptada por Hades, o Senhor do Mundo subterrâneo e que retornou como Perséfone, a “Rainha do Mundo dos Mortos”. O drama encenado e consagrado pelos “Mistérios Eleusínios” não representava apenas a felicidade do reencontro e a recuperação de uma mãe e filha após um trauma, mas a visão transcendental da morte e do renascimento, simbolizada pela volta de Perséfone do mundo subterrâneo e sua transformação em Brimo, “Senhora dos Mistérios”, grávida de Brimos, o filho da luz concebido na escuridão. Para os povos antigos este mito era a vívida e real dramatização do conflito e da oposição entre vida e morte e sua conciliação final pela aceitação e transcendência. A Morte aparece como o raptor e violentador da vida, que irrompe de repente das profundezas do mundo escuro e desconhecido, arrancando e levando consigo não apenas velhos e doentes, mas também ceifando vidas jovens e promissoras. A dor e o desespero humano perante as perdas, são retratadas no luto e na revolta da Mãe Divina, que segue um caminho longo, difícil e tortuoso, saindo da raiva, do ódio e desespero para confronto, luta e a busca de uma solução, culminando com a aceitação e a transmutação das forças do caos e da morte pela iniciação nos Seus Mistérios. O mito das Deusas Deméter e Perséfone, que deu origem aos Mistérios Eleusínios - celebrados por todos aqueles que falavam grego e não tinham cometido nenhum crime - preencheu uma universal e eterna necessidade humana: ultrapassar o terror perante a morte e nutrir a esperança no renascimento. A importância simbólica dos Mistérios foi resumida pelo poeta Homero nesta frase:"Feliz é aquele que dentre todos os homens vivenciou os Mistérios. Aqueles que não foram iniciados, nem deles participaram, não irão usufruir da mesma sorte quando vão morrer e mergulhar na tenebrosa escuridão". O poder sagrado dos Mistérios era tanto, que os antigos gregos acreditavam que, sem a sua celebração anual, a vida iria se tornar insuportável e não apenas a Grécia, mas toda a humanidade iria sucumbir. No início do mito, Kore , alegre e despreocupada estava colhendo flores, quando ficou atraída por uma estranha flor (o narciso), sem saber que ela era consagrada a Zeus e Hades. De repente, Hades apareceu em sua carruagem preta saindo das entranhas da terra e a pegou à força, levando-a para seu reino, a fim de fazêla sua consorte, sem buscar o consentimento dela ou da mãe. Ninguém ouviu os gritos de Kore além de Hécate, da sua gruta, e de Hélios, que tinha presenciado o rapto. Deméter, desesperada e sem saber o que tinha acontecido com Kore, saiu do Olímpo e iniciou uma busca incessante por ela, auxiliada por Hécate e perguntando a todos sobre seu paradeiro. Entristecida e furiosa por não achar sua amada filha, Deméter retirou suas dádivas e bênçãos da humanidade, o que levou à aridez da terra, à seca e à fome. Preocupado com a carestia dos humanos, que pararam de fazer seus sacrifícios e oferendas aos deuses, Zeus enviou Helios para convencer Deméter a parar de chorar e se lamentar, aceitar Hades por ser um poderoso e rico genro (além de ser seu irmão), permitir à filha se tornar mulher e não mais mantê-la dependente de si. Apesar desta intimação, Deméter não aceitou ser coagida, pelo contrario ficou enraivecida com a conivência de Zeus, pai de Kore, com o rapto, e continuou a busca, mantendo-se firme na sua recusa de devolver a vida à terra. Disfarçada em uma mulher idosa e após uma longa peregrinação, Deméter foi parar na cidade de Elêusis, na corte real, onde após alguns contratempos revelou a sua condição divina, ensinou os segredos da agricultura e deu ao povo a dádiva dos grãos, aconselhando a construção de um templo em Sua homenagem, para que nele fossem celebrados os Seus Mistérios.

Zeus acabou cedendo perante a dor de Deméter e as preces dos seres humanos e enviou Hermes para trazer Kore - agora transformada em Perséfone- de volta para a sua mãe; o encontro das duas Deusas é o ponto alto do mito, chamado heuresis, assinalando o fim do sofrimento, o triunfo de Deméter em resgatar sua filha e a volta da abundância para a terra. Porém, antes dela partir, Hades deu-lhe (ou a obrigou) para comer algumas sementes de romã, considerada a “fruta dos mortos”, além de ser um símbolo da fertilidade, fato que selou a sua união e a obrigou a voltar anualmente para o mundo subterrâneo, lá passando um terço do ano como consorte de Hades e “Rainha dos Mortos”, os restantes dois terços acompanhando sua mãe no mundo superior, como Deusas da vegetação. O mito do rapto de Perséfone e do desespero de Deméter representa o esforço coletivo de uma antiga cultura para enfrentar, mitigar e transcender o medo e o dilema humanos ‘ perante a inexorabilidade da morte.


Porém, ao mesmo tempo, ele descreve um evento histórico acontecido milhares de anos atrás, que ainda repercute na nossa existência até hoje. O rapto de Kore e o afastamento forçado da sua Mãe Divina retratam a usurpação e assimilação das religiões centradas no culto à Deusa do Sul da Europa antiga, pelas forças patriarcais invasoras, vindo do Norte e Leste europeu, trazendo consigo o poder da espada e os cultos dos deuses guerreiros. Deméter e Kore pertenciam às milenares tradições nativas matrifocais europeias, enquanto Zeus e Hades faziam parte da hierarquia patriarcal posterior às conquistas. Ao longo de alguns milênios a Nova Religião, com seus deuses dominantes e hierárquicos, se sobrepôs e depois assimilou mitos e símbolos da antiga tradição geocêntrica da Mãe Divina. Em vários mitos esta assimilação foi descrita e representada nas cenas de rapto, estupro, dominação e subordinação das deusas por deuses, que as transformaram em esposas ou amantes submissas ou filhas dóceis servindo aos seus propósitos. Desta maneira, o mito de Deméter e Perséfone pode ser interpretado como um drama descrevendo tensões e oposições históricas, religiosas, sociais e culturais, uma vívida demonstração dos conflitos de valores e conceitos entre o Masculino e o Feminino arquetípico. O imaginário e a dinâmica deste mito podem ser interpretados por duas perspectivas opostas: pelo prisma da permanência milenar dos valores matriarcais ou como a escalada e o triunfo do patriarcado invasor, estabelecendo uma nova ordem religiosa e social. O ângulo depende dos conceitos, necessidades e compensações psicológicas de quem o interpreta, enfatizando alguns elementos e omitindo outros.

Na visão matriarcal – que é mais fidedigna ao significado original - a ênfase está no poder transformador do Feminino, o ponto central sendo a relação positiva entre Mãe e Filha e excluindo o elemento masculino, que aparece de forma violenta e usurpadora rompendo este elo. A Deusa prevalece neste drama, como Mãe resgata a filha dos braços do invasor e do reino da morte; como Filha ela transforma o usurpador, absorvendo na sua matriz o elemento masculino, gestando, transformando sua energia e dando à luz o Filho, com uma nova forma de ser e agir (O Princípio Masclino original purificado e integro). Neste processo, a transformação de Kore em Perséfone e a presença de Hécate ao lado de Deméter, confirmam a supremacia das faces integradas da Deusa Tríplice como Filha, Mãe e Anciã. Na visão patriarcal o tema central é a ascensão do poder masculino, que se apropria de elementos e atributos da Deusa e rompe para sempre os elos matrifocais. Deméter é vista como uma figura negativa, neurótica e possessiva, enquanto Hades é o libertador da filha ingênua de uma dependência materna limitante, despertando-a sexualmente (o rapto visto como uma "iniciação"), tornando-a consorte e rainha e abrindo novos horizontes para a sua atuação. Assim que a Deusa se torna mãe do filho do conquistador, termina a supremacia da Mãe e Filha e é preparado o caminho para o nascimento da Nova Religião, em que se honra por algum tempo a dupla divina Mãe e Filho, substituídos depois pelo domínio do Pai e Filho. Este enfoque explica o predomínio dos comentários e das teorias patriarcais modernos - históricos e psicológicos -, que muitas vezes distorcem ou omitem aspectos do mito original, para validar valores e conceitos que fortalecem as estruturas patriarcais. O nosso mundo atual enfrenta tanto o medo da morte - no sentido literário ou psicológico – quanto as manifestações nefastas e destrutivas do poder patriarcal.

A riqueza mítica e a relevância no nível psicológico e comportamental não se limitam apenas aos períodos ou culturas que lhes deram origem. Assim como Jung demonstrou nas suas obras, os antigos padrões míticos, os temas e os dramas, bem como os símbolos arquivados no inconsciente coletivo aparecem e se manifestam nos sonhos, fantasias, criações artísticas, histórias das vidas e dos relacionamentos humanos contemporâneos. Mesmo que a sua origem e significados sejam ocultos ou enigmáticos para a nossa compreensão, eles podem ter um grande impacto emocional sobre nós. Este impacto é a marca sutil de um arquétipo, que atua no nosso campo astral e emocional, influenciando nosso comportamento e forma de agir ou reagir, mesmo que a nossa razão ou conhecimento intelectual não alcancem seu significado. Cada imagem ou padrão arquetípico pode se manifestar de forma sutil (nos sonhos ou emoções) ou no nível racional (na dinâmica dos relacionamentos pessoais ou coletivos). Esta manifestação dualística é importante ao estudar o mito de Deméter e Perséfone, vendo a manifestação dos personagens envolvidos (Deméter, Kore, Perséfone, Hades) como sendo aspectos, personas ou sombras de uma mesma mulher; ou interpretar o drama no contexto de uma relação entre duas mulheres (mãe e filha, irmãs, parentes, amigas, parceiras, terapeuta e cliente, mestra e discípula). No entanto, devemos levar em consideração a visão que os povos antigos tinham sobre os mitos, que eles viam como representações de uma realidade espiritual, compatível com as suas crenças e práticas religiosas, os deuses sendo figuras multifacetadas da dimensão espiritual.A Deusa Deméter não era apenas uma simples mãe (de uma filha e dos grãos), mas uma deusa tríplice, contendo os aspectos de Chloe (a donzela da primavera) e de Cthonia (a anciã do mundo subterrâneo), todos associados ao ciclo da vida vegetativa. Os seus ensinamentos eram os dons que a própria Natureza dava aos homens: como plantar, colher, seguir os ciclos naturais e das estações. A vida física não era oposta ao espírito, as vicissitudes do corpo e da idade respeitadas como reflexos dos processos naturais. Aquilo que acontecia na Natureza também se passava na vida humana. O fim do ciclo de vida de uma planta era o paradigma da morte humana; a semente abrigada na terra escura germinava e brotava, podendo frutificar (assim como Perséfone se tornou mãe), depois definhava e apodrecia.
Mas ao se tornar composto, ela enriquecia e revitalizava o solo e desta morte fértil nasciam novas sementes, que germinavam, floresciam e frutificavam, a vida contida no fruto sendo liberada na sua morte. Manifestava-se assim o poder da Anciã, que recicla, sem parar, a morte para reiniciar e continuar o permanente ciclo da vida. Ver-se como parte da Natureza, aceitar a dependência humana das Suas forças, participar no eterno ciclo de transformação da vida em morte e novamente em vida, proporcionava aos povos antigos a vibrante e prometedora visão do destino humano. Os mortos eram”plantados” na terra e chamados de “povo de Deméter”(Demeteroi), ou cremados para acelerar a transformação, suas cinzas sendo entregues também à terra, para que a sua decomposição e fertilização do solo proporcionasse o desabrochar de uma nova vida. Na Natureza tudo é reciclado e modificado, nada permanece estático ou fixo, a única constante sendo a mudança que é a assinatura da continuidade. Não existe um processo linear, nem um começo ou um fim, nem a eternidade da vida ou da morte, por isso a transformação era a essência e a base das crenças espirituais pagãs.
Para compreender-mos de fato a profundidade simbólica e a complexidade do mito grego de Deméter e Perséfone, devemos perceber e aceitar a riqueza e fluidez dos conceitos míticos e a sua atuação na nossa vida, procurando nos sintonizar com os ciclos naturais, aceitando as oposições, mudanças, contrariedades, conflitos e paradoxos que são inerentes à natureza humana.

Mirella Faur -IN: Jornal Online Deusa Viva





Demeter - Sandra Honors - 2013
Demeter                                                                          



Uma filha, jovem e muito amada, é raptada de perto da sua mãe por um poderoso governante, conhecido pelos seus atos malvados. A mãe desesperada sai à procura da filha e descobre que o rapto tinha resultado de um acordo entre o supremo chefe religioso e o raptor, sendo que o primeiro era o pai da jovem e o segundo, seu tio materno. Determinada a buscar justiça, com a revolta e a dor devastando sua vida, a mãe inicia um longo e eficiente protesto contra as autoridades, que resulta na volta da filha, traumatizada, mas viva e forte o suficiente para transmutar a sua dolorosa vivência, aceitar e cuidar do seu filho, concebido na escuridão da sua prisão.”

Este relato - de um fato comum no nosso cotidiano atual - descreve a trama mítica de uma antiga história grega, que deu origem a um complexo ritualístico pagão, iniciado no segundo milênio a.C. e praticado durante pelo menos 1500 anos, até mesmo após o advento do cristianismo. A mãe descrita no drama era Deméter, a Deusa dos Grãos, cujas dádivas eram essenciais à sobrevivência humana; a filha era a donzela Kore, raptada por Hades, o Senhor do Mundo subterrâneo e que retornou como Perséfone, a “Rainha do Mundo dos Mortos”. O drama encenado e consagrado pelos “Mistérios Eleusínios” não representava apenas a felicidade do reencontro e a recuperação de uma mãe e filha após um trauma, mas a visão transcendental da morte e do renascimento, simbolizada pela volta de Perséfone do mundo subterrâneo e sua transformação em Brimo, “Senhora dos Mistérios”, grávida de Brimos, o filho da luz concebido na escuridão. Para os povos antigos este mito era a vívida e real dramatização do conflito e da oposição entre vida e morte e sua conciliação final pela aceitação e transcendência. A Morte aparece como o raptor e violentador da vida, que irrompe de repente das profundezas do mundo escuro e desconhecido, arrancando e levando consigo não apenas velhos e doentes, mas também ceifando vidas jovens e promissoras. A dor e o desespero humano perante as perdas, são retratadas no luto e na revolta da Mãe Divina, que segue um caminho longo, difícil e tortuoso, saindo da raiva, do ódio e desespero para confronto, luta e a busca de uma solução, culminando com a aceitação e a transmutação das forças do caos e da morte pela iniciação nos Seus Mistérios. O mito das Deusas Deméter e Perséfone, que deu origem aos Mistérios Eleusínios - celebrados por todos aqueles que falavam grego e não tinham cometido nenhum crime - preencheu uma universal e eterna necessidade humana: ultrapassar o terror perante a morte e nutrir a esperança no renascimento. A importância simbólica dos Mistérios foi resumida pelo poeta Homero nesta frase:"Feliz é aquele que dentre todos os homens vivenciou os Mistérios. Aqueles que não foram iniciados, nem deles participaram, não irão usufruir da mesma sorte quando vão morrer e mergulhar na tenebrosa escuridão". O poder sagrado dos Mistérios era tanto, que os antigos gregos acreditavam que, sem a sua celebração anual, a vida iria se tornar insuportável e não apenas a Grécia, mas toda a humanidade iria sucumbir. No início do mito, Kore , alegre e despreocupada estava colhendo flores, quando ficou atraída por uma estranha flor (o narciso), sem saber que ela era consagrada a Zeus e Hades. De repente, Hades apareceu em sua carruagem preta saindo das entranhas da terra e a pegou à força, levando-a para seu reino, a fim de fazêla sua consorte, sem buscar o consentimento dela ou da mãe. Ninguém ouviu os gritos de Kore além de Hécate, da sua gruta, e de Hélios, que tinha presenciado o rapto. Deméter, desesperada e sem saber o que tinha acontecido com Kore, saiu do Olímpo e iniciou uma busca incessante por ela, auxiliada por Hécate e perguntando a todos sobre seu paradeiro.Entristecida e furiosa por não achar sua amada filha, Deméter retirou suas dádivas e bênçãos da humanidade, o que levou à aridez da terra, à seca e à fome. Preocupado com a carestia dos humanos, que pararam de fazer seus sacrifícios e oferendas aos deuses, Zeus enviou Helios para convencer Deméter a parar de chorar e se lamentar, aceitar Hades por ser um poderoso e rico genro (além de ser seu irmão), permitir à filha se tornar mulher e não mais mantê-la dependente de si. Apesar desta intimação, Deméter não aceitou ser coagida, pelo contrario ficou enraivecida com a conivência de Zeus, pai de Kore, com o rapto, e continuou a busca, mantendo-se firme na sua recusa de devolver a vida à terra. Disfarçada em uma mulher idosa e após uma longa peregrinação, Deméter foi parar na cidade de Elêusis, na corte real, onde após alguns contratempos revelou a sua condição divina, ensinou os segredos da agricultura e deu ao povo a dádiva dos grãos, aconselhando a construção de um templo em Sua homenagem, para que nele fossem celebrados os Seus Mistérios.

Zeus acabou cedendo perante a dor de Deméter e as preces dos seres humanos e enviou Hermes para trazer Kore - agora transformada em Perséfone- de volta para a sua mãe; o encontro das duas Deusas é o ponto alto do mito, chamado heuresis, assinalando o fim do sofrimento, o triunfo de Deméter em resgatar sua filha e a volta da abundância para a terra. Porém, antes dela partir, Hades deu-lhe (ou a obrigou) para comer algumas sementes de romã, considerada a “fruta dos mortos”, além de ser um símbolo da fertilidade, fato que selou a sua união e a obrigou a voltar anualmente para o mundo subterrâneo, lá passando um terço do ano como consorte de Hades e “Rainha dos Mortos”, os restantes dois terços acompanhando sua mãe no mundo superior, como Deusas da vegetação. O mito do rapto de Perséfone e do desespero de Deméter representa o esforço coletivo de uma antiga cultura para enfrentar, mitigar e transcender o medo e o dilema humanos ‘ perante a inexorabilidade da morte.


fonte:http://sagrado-feminino.blogspot.com.br/search/label/DEM%C3%89TER






O Casal Arnolfini                                                        



O Casal Arnolfini - é considerada uma das obras mais notáveis de Van Eyck.



A obra exibe o então rico comerciante Giovanni Arnolfini e sua esposa Giovanna Cenami, que se estabeleceram na cidade de Bruges ( Bélgica), entre 1420 e 1472.



O noivo se dispõe a fazer o juramento com as mãos levantadas e as testemunhas só podem ser observadas, refletidas no espelho ao fundo. Um homem de vermelho e outro de azul, que é o próprio pintor. Acima do espelho podemos ler "Johannes van Eyck fuit hic 1434" - Jan van Eyck esteve aqui em 1434.



Não há um padre, pois até o concilio de Trento não era obrigatória presença deste no casamento.



Existem inúmeros detalhes e minúcias nesta obra, como a cena da paixão ao redor da moldura do espelho,objeto que também significa a pureza; uma única vela acesa num candelabro, simboliza Deus, perante o qual o casamento é realizado; o terço ao lado do espelho sugere a virtude da noiva e o cãozinho a fidelidade; os pés descalços, demonstrando que pisam em solo sagrado; as laranja - maças de adão - símbolo do estado de inocência de Adão e Eva antes do pecado original; Santa Margarida no encosto acima da cama é a patrona dos partos.



Temos também a riqueza dos detalhes do vestido da noiva, com pregas sobre o ventre, que era moda no século XV, assim como também era moda a fronte raspada e o toucado com chifres.
A luz entra em cena através das janelas,com detalhes de vidros coloridos, uma das quais só podemos ver refletida no espelho.
A obra encontra-se desde 1842 na National Gallery de Londres










Mulher segurando uma balança
                                                                   



‎"Mulher segurando uma balança" de Vermeer".
Nessa obra, o centro da composição é uma mão que segura uma balança, numa estreita ligação com a pintura na parede, representando o juízo final. Por esse motivo, alguns críticos afirmam ser essa obra de Vermeer uma alegoria da "vanitas".
Uma análise microscópica,em 1977 revelou que os pratos da balança estão vazios.
Assim, apesar das jóias sobre a mesa, não são elas que são pesadas, e sim, os valores espirituais.

Construí palácios (...), plantei vinhas, fiz jardins e pomares (...) construí reservatórios de água (...). Comprei escravos (...), tive muitos criados (...). Possuí muitos rebanhos (...). Acumulei prata e ouro (...). Arranjei cantores e cantoras e – delícias dos homens – princesas em grande número.
Não recusei nada do que meus olhos pediam, e nunca privei o meu coração de nenhum prazer. Sabia desfrutar de todo o meu trabalho (...).
Então examinei todas as obras que havia feito e o trabalho que elas tinham custado para mim. E concluí que tudo é fugaz e uma corrida atrás do vento, e que não há nada de permanente debaixo do sol. (Ecl 2, 3-12)

O tema "vaidades" , em Eclesiastes, é o texto bíblico que mais claramente acentua o vazio das coisas humanas. Nele se afirma: "Assim como saiu nu do ventre da sua mãe, do mesmo modo sairá desta vida, sem levar consigo nada do que adquiriu" (Ecc. 5:15), ou ainda, "onde estão agora as brilhante insígnias do consulado? Onde estão os aplausos, os coros, os banquetes, os festins? Todas estas coisas passaram, foram noite e sonho". (Ecc. 10:17), nele se faz alusão ao entorpecimento pelos prazeres mundanos, a embriaguez que anula a reflexão serena e lúcida que se avisa que o tempo na terra é limitado - "todas as coisas têm o seu tempo" (Ecc. 3:1).



Alegoria da fé


                                             

Johannes Vermeer "Alegoria da fé "
Vermeer, toma como base o manual de iconografia de Cesare Ripa para simbolizar a fé, onde a figura alegórica descansa o pé sobre um globo. O mundo divino é sugerido pela esfera de vidro. Temos ainda a cena da crucificação, a maça, representando a origem do pecado,a serpente representando a heresia; Satanás esmagado pela pedra, que pode simbolizar a pedra fundamental, a Igreja.
Metropolitan Museum of Art, Nova York - Óleo sobre tela, 114,3 x 88,9 cm




As Fiandeiras 



                                          





As fianeiras - Diego Velázquez - OST 222 X 293 cm
Museu do Prado - Madrid

Observamos nitidamente dois planos no quadro, onde, ao fundo, três moças olham uma tapeçaria, onde observamos Athena - reconhecida pelo capacete - momentos antes de transformar a fiandeira Aracne em aranha.
Aracne, na fabula de Ovídio, enfrenta Athena ao questionar qual das duas teceria as peças mais valiosas. Esse foi o motivo para que a Deusa castigasse Aracne, condenando-a a passar a eternidade tecendo.
As moças, trajadas elegantemente, observam a tapeçaria e também as fiandeiras que tecem sem parar,onde a roda da roca gira tão rapidamente, que nem conseguimos observar seus raios. As moças podem representar a alegoria das artes, - arquitetura, escultura, pintura e a música -  mostrando que os artistas eram superiores aos artesãos. O triunfo das Artes sobre o pesado trabalho artesanal.
Ainda numa referência à fábula, temos o Violoncelo, considerado um remédio contra picadas de aranha.
No primeiro plano, temos um tema aparentemente trivial, com as fiandeiras trabalhando na fábrica Santa Isabel, onde eram tecidas as tapeçarias de Felipe IV.
elas trabalham num ambiente menos iluminado que o plano superior, onde se encontra a tapeçaria. Percebemos as poeiras suspensas no ar, por todo ambiente.
De um lado, uma delas vestida como uma anciã, é Athena, de outro, Aracne, iluminada na cena.







Himeneu Travestido Assistindo a uma Dança em Honra a Príapo




"Trabalho de restauração na obra Himeneu Travestido Assistindo a uma Dança em Honra a Príapo, datada entre 1634 a 1638 de Nicolas Poussin. O projeto de restauração foi patrocinado por CNP Assurances (Caixa Nacional de Previdência) e Caixa Seguros e trouxe ao Brasil restauradores do Museu do Louvre especialmente para trabalharem nesta pintura francesa do MASP. A restauração proporcionou vivacidade para a obra, recuperando suas cores, profundidade e todo seu esplendor. Durante o processo de limpeza, informações importantes foram reveladas, quando removida uma repintura de pudor, provavelmente do séc. XVIII, encobrindo o falo da figura mitológica de Príapo, o deus da fertilidade. Destaca-se também a remoção de repinturas próximas à borda direita que alteravam as vestimentas de um dos personagens da obra, indicado pelos historiadores como Himeneu travestido."

fonte: http://veja.abril.com.br/imagem/popup/quadro-restaurado.shtml



O Código de Hamurabi




                                                   
Em 2340 a.C., Sargão de Akkad (c.2360-2305 a.C.), também conhecido como Sargão, o Grande, promoveu a união das cidades-estado, fundando a dinastia Akkadian, o primeiro império do mundo, numa civilização sumério-acádia.

A expansão do reino                                           


                                                          



Quando em 2025 a.C. os amorreus invadiram a Mesopotâmia, fizeram de Babilônia a capital do reino. As obras de arte revelam que os amorreus eram fisicamente diferentes de seus antecessores. No período amorrita, armazenaram-se mitos antigos, velhas epopéias, textos medicinais e escritos astrológicos. Graças aos escribas, o mundo tem conhecimento de dicionários e legislação daquele glorioso período.

Evidente personagem da Antigüidade, Hamurabi (Khamu-Rabi – sécs. XVIII e XVII a.C.), sexto rei da I Dinastia Babilônica, reinou de 1728 a 1686 a.C., aproximadamente, caracterizando-se como verdadeiro criador do Império Babilônico, guerreiro, político e legislador. No início do séc. XVII a.C., o rei Hamurabi enfrentou uma coalizão de helanitas, assírios e outros, quando ocupou a região ao longo do Tigre até a Assíria, apoderou-se de Sarsa e de Mari, conseguindo a unificação da Babilônia Meridional.

Com ele, a Babilônia tornou-se herdeira de toda civilização sumério-acádia. Resgatou-a, respeitando seu enraizamento, expandiu-a, deixando nela suas marcas, e fazendo da Babilônia uma grande metrópole espiritual. Fundiu a religião dos semitas e sumérios, sobrepondo as figuras divinas afins. Restaurou os mais importantes templos do país e no palácio real de Mari, por ele terminado, encontrou-se, recentemente, 20 mil tábuas de argila com escrita cuneiforme.

À Hamurabi cabe a coleção de legislação mais antiga que se conhece, monumento jurídico da Antigüidade Oriental, universalmente nomeada como o Código de Hamurabi. Encontrado nas ruínas da acrópole de Susa, em 1901, e proveniente do templo do sol, de Ebbara, em Sippar, o monumento com seu código possui 46 colunas e 3.600 linhas, gravado em uma estrela cilíndrica de basalto negro, onde ele é representado adorando Shamash, o deus Sol, de quem recebe o espírito de eqüidade e justiça, em ato de submissão e atenção.

Shamash tem em sua mão esquerda um pequeno cetro e um círculo, símbolo do ciclo dos tempos regulado pelo sol e acima dele se desprende dois feixes de luz.
O Código de Hamurabi prescrevia pena idêntica à ofensa praticada, Lei de Talião, numa concepção jurídica inflexível, que lembra a do Antigo Testamento e que se revela como testemunho de sua preocupação pela vida e bem-estar de seus súditos, garantindo a todo homem igual direito à justiça.

Berta Ricardo de Mazzieri é museóloga do Museu Histórico da Faculdade de Medicina da USP









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