sábado, 20 de julho de 2013

Aby Warburg

Aby Warburg






Enquanto o método formalista de estudo da história da arte - que teve em Heinrich Wölffin ( 1864 - 1945)  o seu maior expoente - se interessa, não pelos conteúdos da arte, mas sim, pelas formas -  a metodologia de Aby Warburg (1866 - 1929),  considera as imagens um fenômeno antropológico  total, onde as motivações para o seu surgimento estariam relacionadas a uma memória coletiva.
A Arte não seria um fenômeno isolado, e a obra de arte seria algo que deveria ser compreendido dentro de um contexto cultural onde foi criada e produzida. Não se poderia entender a obra de arte como um fenômeno isolado.

Fazendo uma análise de uma obra, desde a sua gênese, ele a relaciona com outras tradições, uma vez que as formas em sua origem, são portadoras de significados. Essas imagens não ficaram estáticas no tempo, elas regressam com força, porém transformadas, e fazem referência com a vida e cultura de outras épocas.

Segunda Warburg, seria possível acompanhar o deslocamento histórico e geográfico das imagens. Essas estariam ligadas a realidades culturais específicas, relacionadas a determinada época e a determinado lugar, no entanto, elas  refletiriam problemas e inquietações, e movendo-se  pelo tempo e espaço, reapareceria incessantemente, como "vida em movimento", cujos traços importantes e significativos  estariam inscritos na memória da humanidade. Haveria uma apropriação e ressignificação dessas imagens.
Ha um questionamento, portanto, sobre a ideia de uma linha evolutiva da história.
A imagem, para Warburg seria uma formação simbólica que traz a memória de uma origem que a carregou de energia e através da qual ela sobrevive nas suas manifestações históricas.
A questão da sobrevivência de formas de um tempo passado para  outro, já tinha sido abordado por Warburg em seus estudos de doutorado em História da Arte, sobre Botticelli.
Nesses estudos, ele investiga acerca da utilização de formas clássicas durante o renascimento italiano.
Ele observa, então, a preocupação de Botticelli em dar um movimento acentuado às vestes e cabelos das figuras femininas, nas obras, "O nascimento de Vênus" e " A primavera". Constata que as modelos foram tiradas de sarcófagos greco-romanos com figuras de ninfas, e que o exagero e a ênfase nos movimentos já citados, não condiziam com o naturalismo que se buscava durante esse período.
Haveria, portanto, segundo o historiador, uma motivação psicológica, que justificaria a reutilização de formas antigas, em plena cultura dos "quattrocentos".
À partir dessas constatações, passa a desenvolver seus estudos que resultariam nas suas concepções sobre a  transmissão da cultura de uma memória coletiva através de uma imagem.
Dando continuidade a seus estudos, Warburg desenvolve seu projeto "Mnemosyne", organizando em pranchas, fotografias que segundo ele, sintetizavam  sua ideia acerca da função psicossocial das imagens.

No livro de Aby Warburg "A renovação da antiguidade pagã - contribuições científico-culturais para a história do renascimento europeu" , o editor, César Benjamim escreve:

"Para se entender a reviravolta provocada por Aby Warburg (1866-1929) na história da arte, podemos partir de Johann Winckelmann, a figura dominante dessa disciplina durante muito tempo. Em 1755, Winckelmann propôs um enunciado que definiu a maneira como passamos a compreender a arte clássica grega: "O caráter geral que distingue as obras-primas gregas são a nobre simplicidade e a grandeza serena, tanto na postura quanto na expressão. Assim como as profundezas do mar se mantêm calmas em todos os momentos, por mais enfurecida que esteja a superfície, também a expressão, nas figuras dos gregos, mesmo no seio das paixões, exibe uma alma sempre grandiosa e sempre impassível."


Os trabalhos de Warburg alteraram profundamente essa percepção, ao destacarem a representação do movimento. Segundo ele, o que predominou na Antiguidade não foi o corpo imóvel e bem equilibrado, e sim o corpo tomado por um jogo de forças que o ultrapassava, que o fazia aparecer com os membros retorcidos na luta ou dominados pela dor, com os cabelos soltos e a roupa esvoaçando sob o efeito da corrida ou do vento.


Ao insistir mais nos fenômenos de transição do que no tratamento dos corpos em repouso, mais naquilo que divide a figura do que naquilo que a unifica, mais no devir do que na forma imóvel, Warburg inverteu os princípios da estética clássica e a hierarquia das artes que dela procede: no lugar do modelo fornecido pela escultura, pôs o da dança, enfatizando a dimensão cênica e temporal das obras.


As ideias de arte e de história passaram por uma reviravolta decisiva. Os artistas do Renascimento não haviam preservado nas formas antigas uma associação entre a substância e a imobilidade, privilegiando o ser em relação ao devir. Ao contrário, haviam reconhecido uma tensão. Suas obras levam a marca de uma força que não é de harmonia, mas de contradição, uma força que mais desestabiliza do que unifica as figuras.


À luz da análise de Warburg, a divindade serena que servia de modelo ao belo ideal transforma-se em mênade de gestos convulsivos e de violentos arrebatamentos: "Essas mênades dançantes, conscientemente imitadas, surgidas pela primeira vez nas obras de Donatello e de Fra Filippo, redefinem o estilo antigo, ao exprimirem uma vida mais movimentada, a vida que anima a Judite, o anjo Rafael que acompanha Tobias, ou ainda a Salomé dançante, essas figuras aladas que alçaram voo dos estúdios de Pollaiuolo, Verrocchio, Botticelli ou Ghirlandaio."


Nietzsche tinha dado a fórmula dessa mutação, vinte anos antes, ao descrever a irrupção das forças dionisíacas na equilibrada simetria apolínea. Uma potência extática brotava no seio da concepção contemplativa do mundo; dessa contradição aberta deveria nascer a tragédia ática, a mais rematada realização da cultura grega. Warburg fez dessa tensão a base da relação dos artistas modernos com o passado, revelando, sob a aparência límpida das obras da Antiguidade clássica, o conflito das duas forças antagônicas de que elas provieram e que as condicionou.

A renovação da Antiguidade pagã: contribuições científico-culturais para a história do Renascimento europeu" traz todos os textos publicados por Aby Warburg em vida. Torna-se, desde já, referência definitiva para os estudos das humanidades no Brasil."

Para Warburg, o tempo da imagem não seria necessariamente o tempo da história, o que não seria compatível com um  modelo de evolução, o que colocava em xeque toda uma tradição que nascera com Vasari e fora continuada por Winckelmann, segundo a qual, haveria na arte um período de progressão seguido de uma decadência.
Warburg transforma sua biblioteca  em  um  Instituto , cujo foco é a influência da antiguidade clássica na civilização europeia, defendendo uma abordagem  interdisciplinar, dando início a uma nova maneira de entender a história da arte. O Instituto continua com Fritz Saxl, que o transforma em instituto de pesquisa, com representantes de diversas disciplinas. Em um primeiro momento, o Instituto era filiado a Universidade de Hamburgo, mas com o Nazismo, mudou-se para Londres.
Vinculados ao Instituto figuram  nomes como Erwin Panofsky, Fritz Saxl e  Gombrich.

Sandra Honors

Referências:
Guia da História da Arte - Giulio Argan
Aby Warburg e os arquivos da memória - Antônio Guerreiro
As imagens sem memória e a esterilização da cultura - Antônio Guerreiro









Aby Warburg: Archive of Memory (26 minutes, 2003) from Eric Breitbart on Vimeo.

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