domingo, 22 de novembro de 2009

Maria Madalena




Pintura a óleo
"Maria Madalena"




Medidas: 0,80X1,00
Informações: (11) 86322156


Sandra Honors/2009


“Meu Deus, tu és o Deus da primavera,
O que faz florescer, o que faz crescer.
Será que é mesmo necessário que sejamos “pequeninos”
Para que tu sejas todo-poderoso?
“Pobres pecadores”, para que tu sejas misericórdia?
Não é suficiente que estejamos nus, para que tu brilhes,
Que estejamos vazios, para que tu sejas tudo?
Tu não és um Deus que desconfia das mulheres,
Que canoniza os santos e queima as feiticeiras.
Tu és belo e amas a beleza
Eu orei a ti, com freqüência, Meu Deus
Para que me livrasses dos deuses que acusam
Que desprezam e fanatizam...
E tu me enviaste a primavera: a amendoeira
Floresceu.
Respirei o grande dia e a grande noite,
Reconheci teu sopro no jardim,
Tua brisa à beira do lago.
Tu me ensinaste que rezar mais
É respirar melhor.
Ainda não sei se és o Deus dos amantes,
Se fores aquele que ama em todos os que amam.
.......................................................................
Amo-te sem te ver, sem te tocar
E, no entanto, sei que me deste
Olhos para ver e braços para abraçar.
Um dia talvez, em cores oceânicas,
Um homem virá
Para te dar um semblante
E abençoar a terra na oferenda de meu corpo;
Então, eu te amarei, meu Deus
Como as mulheres amam,
Como as crianças,
Como a tempestade
E nos tornaremos Um.”

O ROMANCE DE MARIA MADALENA - Jean-Yves Leloup



Há muito tempo, Madalena é uma personagem que desperta as mais variadas questões de fé no interior do pensamento cristão. Em tempos medievais, ela poderia representar a mulher como um ser, cheio de pecados e que deveria se apoiar na fé para tentar se firmar contra os instintos de sua condição natural. Recentemente, a popularização dos textos apócrifos (não reconhecidos oficialmente) a colocam sob a perspectiva de uma companheira de Cristo que fora essencial para a disseminação do cristianismo

Ao contrário das várias outras Marias que aparecem na Bíblia, Madalena não tem seu nome vinculado a um marido ou pai. Contudo, o seu sobrenome, pode também remeter à prospera cidade comercial de Migdal, onde ela supostamente teria nascido. Ainda hoje, é possível encontrar um antigo letreiro nas ruinas dessa cidade que descreve essa enigmática mulher como uma serva de Cristo.

Paralelamente, o termo “Madalena” significa “torre” em aramaico. Em termos simbólicos, a torre é um lugar privilegiado, do qual se pode ter uma visão mais ampla das coisas. Coincidentemente, ela é a personagem da narrativa bíblica que percebe inicialmente que a sepultura de Cristo estava vazia ao terceiro dia. Em certa medida, essa primeira percepção salienta toda uma discussão que pretende circunscrever qual o papel dela na história do cristianismo.

Na coleção oficial dos livros bíblicos ela expõe um ideal de fragilidade e arrependimento, ao ser vinculada à imagem de uma prostituta que se arrepende da sua vida pregressa para seguir Jesus. Em seu primeiro encontro com o Messias, ela se livra de sete demônios que ocupavam seu corpo. Observando a recorrência do número sete, podemos ver que a sua salvação aglomerava o fim de uma obra (como o tempo de criação do mundo) e a libertação de todos os pecados (os sete pecados capitais).

Mais que uma humana arrependida, ela se coloca deste modo como uma mulher completamente redimida e livre de qualquer espécie de pecado. Contudo, se existia a possibilidade dessa interpretação ter sido consolidada, ela acabou desaparecendo quando o papa Gregório Magno (540 - 604) e, seguidamente, os textos da Inquisição tiveram a função de colocá-la na vacilante posição de uma mulher que caminhou entre os tênues limites da salvação e do pecado.

Após a ascensão de Cristo, a imagem de Maria Madalena desaparece como a de uma mulher que não mais teria utilidade. Contudo, em uma passagem no livro de Romanos, o apóstolo Paulo salienta que, entre várias pregadoras do cristianismo, Maria teria feito “muito por vós”. Mesmo não especificando que Maria seria essa, vale lembrar que Madalena teria grandes possibilidades de atuar como pregadora na condição de mulher livre do matrimônio e nascida em uma movimentada cidade comercial.

Por meio desses indícios, a suposta veracidade dos textos apócrifos – especialmente do Evangelho de Felipe – ganham uma proporção incendiária. A dimensão de uma mulher livre e independente se potencializa com a figura da mais próxima seguidora de Cristo, que teria por ela um amor de dimensões carnal e espiritual. Apesar de polêmica e ativadora de várias interpretações atraentes, os indícios históricos não são suficientes para que ela seja firmada como a “esposa de Cristo”.

Devemos salientar que os textos apócrifos que sugerem o contato íntimo entre Cristo e Madalena também podem estar fazendo uma construção simbólica. As manifestações do corpo são comumente utilizadas como alegorias que exprimem a consumação de uma experiência espiritual superior. A própria descrição bíblica que relata que Jesus suou sangue pode, por exemplo, representar a agitação do Messias ao reconhecer a proximidade de seu destino no mundo.

Mediante a precariedade de um veredicto, vemos que a fragmentação de Madalena em outras imagens expõe a vivacidade que a experiência religiosa pode ter em nosso cotidiano. De um lado, a construção de uma Maria Madalena mais positiva reforça o valor cristão que há muito tempo salienta que “os últimos serão os primeiros”. Por outro, essa mesma imagem pode saciar as questões de um tempo presente, onde as mulheres ganham outro lugar na sociedade e a autoridade clerical já não é mais a mesma.
Por Rainer Sousa
Graduado em História
Equipe Brasil Escola